A NASA já viu dias melhores. A agência aeroespacial norte-americana está sob a ameaça de um corte violento no orçamento para 2026, onde a Casa Branca e o Congresso não entram em acordo, um dos vários motivos que levou ao shutdown, que já dura 21 dias. Mesmo assim, o presidente Donald Trump quer astronautas de volta à Lua durante seu mandato, e antes da China, não importa como.
O problema: a SpaceX estaria atrasada em apresentar uma versão da Spaceship que funcione como um lander lunar para a missão Artemis III, originalmente agendada para 2027; agora, segundo o administrador interino Sean Duffy, a NASA deverá abrir uma nova concorrência, onde contaria principalmente com a Blue Origin de Jeff Bezos. Elon Musk, para variar, não curtiu.
NASA quer opções para missão lunar
Vamos dar uma repassada nos acontecimentos até aqui:
Em 2021, a SpaceX ganhou uma licitação de US$ 2,89 bilhões (~R$ 15,6 bilhões, cotação de 21/10/2025) para desenvolver uma versão HLS (Human Landing System, ou Sistema para Pouso Humano) da Starship, para pousar e decolar da Lua, no plano maluco da missão tripulada Artemis III:
- O SLS lança a cápsula Orion, com os astronautas a bordo, em direção à Lua;
- Ao mesmo tempo, a Starship é lançada vazia, abastece em órbita, e segue também para o satélite;
- A Starship se acopla à Orion, os astronautas embarcam, e ela segue para a Lua;
- No retorno, a Starship decola, se acopla novamente à Orion, os astronautas mudam de nave outra vez;
- A Orion segue para a Terra com os astronautas;
- A Starship volta para a Terra vazia.
Isso foi feito para garantir o uso tanto do foguete SLS quanto da cápsula Orion, que consumiram rios de dinheiro público e precisam ser justificados, mesmo com Starship podendo (em tese) fazer tudo sozinha, ela foi reduzida a um estepe. A SpaceX desbancou projetos da Dynetics e da Blue Origin, no que Jeff Bezos não aceitou o resultado e processou a NASA, o que causou atrasos significativos no projeto.
Como forma de um “calaboca”, a Blue Origin foi agraciada com um contrato para a missão Artemis V, esta planejada apenas para a próxima década, onde ela entregaria seu lander próprio chamado Blue Moon, nascido de uma joint venture com Lockheed Martin, Draper, Boeing, Astrobotic, e Honeybee Robotics.
O Blue Moon, uma versão revista de um projeto mais antigo (ele não é o ILV derrotado pela Starship), usa um novo motor BE-7 abastecido com oxigênio e hidrogênio líquidos, uma versão vitaminada do BE-3U usado pelo foguete New Glenn. O módulo conta com duas versões, uma descartável, capaz de levar até 30 toneladas de carga, e um retornável que os astronautas vão usar, que comporta até 20 t.
Voltando ao presente, a Casa Branca quer forçar goela abaixo da NASA a proposta de orçamento de US$ 18,8 bilhões (~R$ 101,3 bilhões), que corta 47% da verba do setor de Ciência em relação a 2025, e propõe o encerramento de tudo o que não for ligado à exploração espacial, especialmente missões de monitoramento climático, que segundo Trump, são “Fake News” e “golpes verdes“.
O atual administrador interino, Sean Duffy, diz que a missão da NASA é “explorar o Espaço, e não fazer ciência na Terra”, mas se os cortes se concretizarem, seus profissionais não terão dinheiro nem para o básico; a ideia seria forçar a terceirização de tudo, reduzindo a agência a uma agência de frete, o que pode ter um efeito catastrófico na imagem do órgão.


NASA vai buscar alternativas à versão lander lunar da Starship, que para Sean Duffy (e Donald Trump), está atrasada (Crédito: Divulgação/SpaceX)
Ambas casas do Congresso dos Estados Unidos, Câmara e Senado, apresentaram contra-propostas para o orçamento da NASA que liberariam mais dinheiro, o primeiro mantendo os cortes na Ciência (o que Duffy orientou a NASA a usar como base durante o shutdown), e o segundo sendo uma cópia do de 2025, mas Trump não quer nenhum dos dois, e fica o impasse.
Por outro lado, mesmo com muito menos grana, o presidente insiste que astronautas americanos devem voltar à Lua o mais rápido possível, leia-se dentro de seu mandato, para “vencer a China no Espaço” a todo custo, o que nos traz à situação atual da missão Artemis III.
Nesta segunda-feira (20), durante uma entrevista ao canal CNBC, Sean Duffy disse que a NASA “irá explorar novas alternativas” para a missão, e disse que a Starship HLS “está atrasada”:
“Eu adoro a SpaceX, é uma companhia incrível (…). O problema é que eles estão atrasados. Eles estenderam seus prazos, e nós estamos em uma corrida contra a China.
O presidente e eu queremos ir à Lua dentro do mandato, então eu terei que (re)abrir a licitação. Vou deixar outras companhias competirem com a SpaceX, como a Blue Origin.”
Já na Fox News, ele foi além ao dizer que Trump “quer garantir” que a América vença a China na corrida para a Lua até janeiro de 2029, justificando a reabertura da licitação devido o atraso da SpaceX:
A little COMPETITION doesn’t hurt and it spurs INNOVATION! 💡
American companies are going to be able to compete to see which one can get us back to the Moon first. 🇺🇸
We going to beat China there and we are going to do it under @POTUS! 🚀 pic.twitter.com/PbZ8gbLSL8
— NASA Acting Administrator Sean Duffy (@SecDuffyNASA) October 20, 2025
E tão certo quanto o Sol que nasce todas as manhãs, Elon Musk não gostou nem um pouco disso.
No X, o dono da SpaceX rebateu as declarações do administrador interino da NASA, dizendo que a Blue Origin “nunca lançou uma carga em órbita”, o que ele depois corrigiu para “carga útil”, como se o Tesla Roadster tivesse real utilidade. Em outra postagem, ele disse que ninguém é mais rápido que sua empresa, no momento “trabalhando na velocidade da luz” quando comparada aos competidores, mas mesmo assim, nenhum progresso foi visto na Starship HLS nos últimos anos.
O bilionário acrescentou que seu foguete irá assumir todo o programa lunar no futuro, com direito a um irritadíssimo “marquem minhas palavras”; já em outro post ele chegou a chamar Duffy de gay, o que mede o quão furioso Musk ficou.


Elon Musk não curtiu indireta de Sean Duffy, enquanto Jeff Bezos, muito provavelmente, deve estar rindo a beça (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)
Não obstante, Duffy admitiu que a missão Artemis III não deverá mais ser lançada em 2027 devido à enrolação da SpaceX, e que outras companhias além da Blue Origin deverão entrar na competição, no que a Lockheed Martin já se prontificou a participar; em nota enviada ao site Ars Technica, um porta-voz da companhia disse que eles “estão prontos caso a NASA entre em contato”.
Considerando que Donald Trump quer garantir vitórias significativas no espaço em seu segundo mandato, a companhia de Elon Musk não ter conseguido entregar uma Starship funcional, capaz de decolar e pousar sem explodir, dentro do prazo prometido que vence em 2025, o irritou ao ponto de repassar a Duffy a missão de reabrir a licitação, e se Musk está achando ruim, que se vire para cumprir os prazos.
Enquanto isso, embora a Blue Origin esteja desenvolvendo o Blue Moon, o projeto visava o uso do lander na missão Artemis V que nem está mais garantida (Trump quer encerrar o programa após o retorno dos astronautas à Lua, com direito a descartar tanto o SLS quanto a Orion, por serem caros demais), assim, não se sabe se a empresa de Jeff Bezos (que deve estar rindo muito às custas do piti de Musk) conseguirá se sair melhor que a SpaceX.
No fim, tanto Blue Origin quanto SpaceX e outras empresas deverão se forçar a entregar projetos funcionais para a missão lunar ser lançada antes do fim do mandato de Trump, e mais importante, antes de qualquer taikonauta, afinal, concorrência é sempre bom.
Fonte: The New York Times
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