A escalada das críticas do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), à atuação do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos nos últimos dias acendeu um alerta em líderes da oposição. O filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, que deixou o Brasil em março deste ano, é alvo de diversos pedidos de cassação e integrantes do PL buscam agora minimizar a crise para tentar salvar o mandato do deputado.
Na última sexta-feira (15), por exemplo, Motta assinou o despacho que liberou ao menos quatro pedidos de cassação de Eduardo Bolsonaro para análise do Conselho de Ética. Todos os requerimentos foram protocolados na Mesa Diretora da Câmara por partidos de esquerda, sendo três do PT e um do PSOL.
Os partidos argumentam que Eduardo deve ser punido por quebra de decoro por supostamente atuar contra o Brasil nos EUA e a favor de sanções a autoridades brasileiras. Segundo o regimento da Câmara, após o recebimento da representação, o conselho se reúne para instaurar formalmente o processo e a abertura é obrigatória.
A partir daí, serão sorteados três nomes de deputados para fazer o papel de relator do caso. Caberá ao presidente do colegiado definir um dos nomes sorteados para assumir a relatoria. Esse relator apresentará parecer que diz se o processo pode seguir ou se deve ser arquivado.
No rito regimental, o deputado denunciado também é notificado para apresentar uma defesa inicial. Na véspera da decisão de Motta sobre os pedidos contra Eduardo Bolsonaro, o filho do ex-presidente Bolsonaro deu entrevistas sinalizando que o presidente da Câmara e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), também poderiam ser alvos de sanções por parte do governo de Donald Trump.
Mesmo nos EUA, o filho do ex-presidente reassumiu o seu mandato depois que a sua licença de 120 dias para “tratar de interesses pessoais” foi encerrada no final de julho. Desde então, Eduardo Bolsonaro começou a ter faltas não justificadas registradas durante as sessões da Câmara. Além dos pedidos de cassação, o deputado pode ainda perder o mandato em decorrência das ausências, caso falte a mais de um terço das votações do plenário.
Nesse cenário, Hugo Motta subiu o tom das críticas contra Eduardo Bolsonaro e classificou a decisão do deputado de ir para os EUA como “incompatível com o exercício parlamentar”. Segundo ele, o filho de Bolsonaro tem o direito de ser contra o julgamento do Supremo contra seu pai, desde que não atue contra o país para prejudicar as empresas e a economia.
“Eu tenho dito que não existe mais ou menos deputado, existe o deputado. Da mesma forma que não há previsão regimental do exercício do mandato à distância e o deputado Eduardo Bolsonaro, quando tomou a decisão de ir para os Estados Unidos cumprir o papel que ele acha correto, ele sabia que era incompatível com o exercício parlamentar”, disse Motta em entrevista à GloboNews.
VEJA TAMBÉM:
Oposição tenta encontro de Motta e Jair Bolsonaro para tratar de Eduardo
Para tentar minimizar a pressão do governo para que Motta acelere o trâmite dos pedidos de cassação de Eduardo Bolsonaro, líderes da oposição costuram agora um encontro de Motta com Jair Bolsonaro. Com a prisão domiciliar do ex-presidente, a visita depende de autorização por parte do ministro Alexandre de Moraes.
A proposta já teria sido apresentada ao próprio Bolsonaro, que teria concordado com o encontro, e também a Motta, que, segundo interlocutores, demonstrou disposição para a visita. Segundo o líder da oposição, Luciano Zucco (PL-RS), o ex-presidente foi um dos principais apoiadores da candidatura de Motta à presidência da Câmara.
“Ele manifestou o desejo de receber algumas lideranças políticas, e a defesa fará os pedidos de acordo com essas prioridades”, afirmou Zucco após se reunir com Bolsonaro na última quinta-feira (14).
Líderes do PL avaliam que uma eventual visita do presidente da Câmara serviria como um gesto simbólico de aproximação com a oposição e poderia fortalecer a articulação política do partido para o segundo semestre. Além disso, os parlamentares acreditam que Bolsonaro poderá usar o encontro para tentar evitar a cassação do mandato de Eduardo Bolsonaro pelo Conselho de Ética.
Aos seus interlocutores, Motta tem demonstrado incômodo com as declarações de Eduardo Bolsonaro e indicado que não será intimidado pelo que considera serem “ameaças” do parlamentar do PL. Publicamente, o presidente da Câmara afirmou não ter receio de ser alvo de sanções por parte do governo Trump, caso não ele não coloque em votação projetos de interesse da oposição.
“Não tenho nenhum receio de qualquer colocação. Presidir a Câmara dos Deputados exige responsabilidade, há bônus e ônus”, disse Motta ao ser questionado sobre as falas de Eduardo Bolsonaro.
Motta e Alcolumbre podem sofrer sanções dos EUA
Em meio à escalada da crise, Eduardo Bolsonaro afirmou na última sexta-feira (15) que sua permanência nos Estados Unidos não foi voluntária, “mas resultado de uma coação devido à falta de respeito às prerrogativas parlamentares no Brasil”. “Eu fui coagido a ficar nos EUA, porque a instituição a que eu pertenço não consegue garantir meus direitos e liberdades contra o regime de exceção”, declarou.
Segundo ele, o presidente da Câmara estaria ciente da situação e também sofreria ameaças. “Hugo Motta deveria saber bem o que é isso, afinal, também está sendo ameaçado pelo regime, que pegou seus parentes como reféns para usar como meio de chantagem e impedir a anistia”, publicou o filho de Jair Bolsonaro.
Na véspera, o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro disse à agência Reuters que espera novas tarifas dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros e sanções adicionais a autoridades do país. Já em entrevista à BBC News, Eduardo citou que “Motta e Alcolumbre estariam no radar da Casa Branca”.
“Eles [Motta e Alcolumbre] já estão no radar, e as autoridades americanas têm uma clara visão do que está acontecendo no Brasil e sabem que, por exemplo, o processo de anistia depende de ser iniciado pela mesa do presidente Hugo Motta”, afirmou o deputado.
O risco das sanções por parte dos EUA ao Brasil e às autoridades pode aumentar após o indiciamento de Eduardo e Jair Bolsonaro. O deputado e o ex-presidente foram indiciados pela Polícia Federal, nesta quarta-feira (20), por tentativa de obstrução de Justiça no processo sobre a suposta tentativa de golpe de Estado.
O indiciamento ocorre no âmbito da investigação sobre a atuação do deputado nos Estados Unidos contra autoridades brasileiras. A PF atribuiu a Bolsonaro e Eduardo os crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa (processo do golpe) e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Já o pastor Silas Malafaia foi alvo de busca e apreensão ao desembarcar no Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro.
Integrantes do PL defendem que Eduardo não parta para o confronto contra Motta
Aqui no Brasil, integrantes do PL defendem que Eduardo Bolsonaro não deve partir para o confronto, já que tal postura prejudica as articulações políticas da oposição em andamento. Na Câmara, por exemplo, os aliados de Jair Bolsonaro tentam viabilizar a tramitação da PEC do fim do foro e a anistia aos presos do 8 de janeiro de 2023 após o fim da ocupação dos plenários do Congresso.
No Centrão, o pedido dos líderes é para que o presidente da Câmara possa agir com “cautela” para evitar a tensão na Casa. Por isso, a avaliação é de que o melhor caminho seria que Eduardo tivesse a perda de mandato por conta de suas ausências nas sessões de votações.
Desde o fim do recesso, em 4 de agosto, Eduardo Bolsonaro já contabilizou ao menos 8 faltas injustificadas. As ausências são contadas nas sessões deliberativas ordinárias e extraordinárias com abertura da ordem do dia. Até 5 de março do ano que vem, a Secretaria-Geral da Mesa deve enviar à presidência um relatório com a frequência consolidada dos parlamentares no ano anterior. Motta pode pedir o arquivamento do documento ou definir um integrante da Mesa para analisar as ausências excessivas.
Deixe um comentário